Querido Pedro, Não me senti minimamente provocada pelo poema que partilhaste comigo. Sinto-me lisonjeda por teres partilhado comigo as palavras que só suportas sendo declamadas. Ontem saí com a Joana, não fomos a um bar nem a nenhum lugar semelhante. Pensando bem, mal chegámos a sair. Pensando bem, os caminhos do jardim dela não se parecem com uma saída. Falámos muito sobre muitas coisas. É obvio que, mais tarde ou mais cedo, te tornaste no tema de conversa. Há algo que ela me disse que me ecoa pelo peito e que queima o ar que respiro. Sabes como é a Joana; firme, directa e simples. "Se por uma vez na vida deixasses de chamar coragem à cobardia...", achas que ela tem razão? Achas que pintamos o nosso medo com as cores da razão? Assustaste-me hoje. Não é teu hábito, ao Domingo, estar a pé as nove da manhã, muitos menos na rua. Passar-se o mesmo comigo já não é estranho. Sabes, todos as manhãs te olho pela janela e espero que saias para depois sair eu e nossos caminhos não se cruzarem. Esta manhã, como todos os Domingos, achei que não seria necessário, que estarias a dormir, recuperando de uma noite com os amigos. Mas desta vez não. Ia sair do prédio quando te vi na rua. Atabalhoadamente atirei-me para o lado de lá da porta e caí. O velho porteiro ficou a olhar para mim como se eu fosse louca, nem sequer me tentou ajudar, fitou-me apenas com aqueles enormes e trémulos olhos cinzentos como se realmente eu fosse uma aberração da natureza. Mas não foi o primeiro. Isto tem-me acontecido frequentemente, e isso assusta-me, por mais que me custe a admiti-lo. Tenho medo de que os olhares deles tenham razão. Lembras-te de quando discutíamos? Era rara a discussão em que não me chamasses louca, tal com era rara a discussão em que eu não te chamasse egoísta. E isto é que me preocupa. Se fossem apenas os outros a julgarem-me louca, eu conseguiria fazer a minha vida normalmente, mas a possibilidade da visão deles ser partilhada contigo deixa-me apavorada. O Gui já fala! A minha irmã está eufórica. A primeira palavra (talvez chamar-lhe som fosse o mais acertado) foi "Ena", ora bem, isto para mim é o diminutivo de Helena, mas a minha irmã não me parece convencida. Tenho que me despedir agora, vou almoçar a casa da minha avó e já vou atrasada. Devo chegar tarde, não te preocupes pela escuridão vinda da minha casa. Passo-te as mãos pelos olhos e beijo-te a testa apertando-te bem contra mim, abraço-te e deixo que sintas o meu coração dentro do teu peito. |
Amor Selado
As cartas do nosso amor que por amizade selamos.
3 Comments:
"Sabes, todos as manhãs te olho pela janela e espero que saias para depois sair eu e nossos caminhos não se cruzarem."
o caminho dela pode não cruzar-se com o dele mas, assim, o dele cruza-se certamente com o dela. :)
adoro o conceito deste blog! continuem o bom trabalho ;)
beijinho pos dois*
não pude evitar um sorriso ao imaginar a Helena a atirar-se para trás atabalhoadamente a fim de evitar o Pedro...
Beijinho grande:)
Antes de mais, quero agradecer a vossa resposta, bastante subtil mas tava lá keu bem vi, à minha pergunta do "Ah e tal moram em frente um ao outro e nc se cruzam... estranho". Estou esclarecida.
mas então a Helena de vez em kdo e de kdo em vez vê o Pedro em tempo actual... doloroso, diria eu... ou não.
E agora depois de mais,"abraço-te e deixo que sintas o meu coração dentro do teu peito." - que lindíssimo!!
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